Aos 80 anos da morte de León Trótski: Uma avaliação sobre o “trotskismo” orientada aos dias de hoje

Aos 80 anos da morte de León Trótski: Uma avaliação sobre o “trotskismo” orientada aos dias de hoje

Por Alejandro Acosta

Algumas Teses Centrais

  1. As principais contribuições de León Trótski para o socialismo científico (ou marxismo) foram: a teoria da revolução permanente atualizada para os países atrasados, na época do imperialismo; a luta, e teorização, contra a burocratização nos países atrasados onde a revolução operária triunfou; o Programa de Transição de 1938, com a atualização da política e das palavras de ordem para a época de transição do capitalismo ao socialismo, o imperialismo; a caracterização e luta contra o fascismo por meio da frente única operária. Também foi um mérito ter mantido vivos os princípios do socialismo científico nas duras condições do fascismo e a consolidação da burocracia na União Soviética, principalmente a partir do I Plano Quinquenal.
  2. O termo “trotskismo” foi criado pela burocracia soviética, no período inicial, para contrapô-lo ao “leninismo”, do qual a burocracia seria a representante. Em cima da brutal pressão do aparato da burocracia soviética, o próprio Trótski passou a usar os dois termos. Lenin repudiou o uso do termo “leninismo”; ele tanto se considerava apenas um discípulo de Karl Marx, um “contribuinte” do socialismo científico que não queria que fossem publicadas as obras completas dos próprios escritos.
  3. Após a Revolução de Outubro, Vladimir Ilich Lenin nas Teses de Abril, chegou por conta própria, levado pela própria prática, às mesmas conclusões que Trótski tinha chegado na Revolução de 1905: a necessidade da retomada da teoria revolução permanente elaborada por Karl Marx, mas agora nas condições dos países atrasados. Trótski abandonou a concepção do partido operário revolucionário como um partido “laxo” e adotou as teses e a política de Lenin que ele tinha combatido no período anterior. A partir de 1915 (Conferência de Zimmerwald), Trótski foi um militante de destaque no combate ao oportunismo, pela revolução permanente e o internacionalismo proletário.
  4. Durante a Revolução de Outubro, Trótski desempenhou um papel de primeira ordem e foi um dos primeiros a reagirem contra a burocratização da União Soviética.
  5. Por causa do exílio prematuro, além de caraterísticas pessoais, Trótski nunca capitulou à burocracia soviética, mesmo quando os seus filhos e genros foram assassinados um atrás do outro, assim como foi feito com todos os membros do Comitê Central do Partido Bolchevique de Outubro de 1917, menos três deles (Sverdlov, Lenin e José Stalin).
  6. Com o aumento brutal da pressão da burocracia soviética, os principais dirigentes da Oposição de Esquerda, que tinham sido os principais dirigentes da Revolução de Outubro, todos capitularam até 1934. A resistência ainda continuou, junto com assassinatos prematuros, nos campos de concentração. Os processos de Moscou foram o produto do gigantesco acirramento da luta de classes na União Soviética, que teve como um dos componentes o aniquilamento físico dos principais dirigentes revolucionários em todo o mundo, a começar na própria União Soviética, além de Trótski e a sua família.
  7. Trótski buscou preparar os revolucionários para enfrentar a brutalidade da Segunda Guerra Mundial e, ao mesmo tempo, o inevitável ascenso operário que viria. A preocupação principal se encontrava na Europa, onde esperava que a guerra contrarrevolucionária provocaria importantes revoluções. Também acompanhou com cuidado a situação na Ásia, principalmente no Japão, China, Índia, Indochina, Indonésia e Ceilão (hoje Sri Lanka). (ver 58)
  8. Na segunda metade da década de 1930, uma série de acontecimentos geraram enorme confusão no campo revolucionário. (ver 51)
  9. A crise recorrente do “estalinismo”, gerada pelo acirramento da luta de classes, acabou gerando e fortalecendo o fantasma do “Trotskismo”, do qual a burocracia soviética se valeu para impor sua política contra todos os opositores. Isto aconteceu principalmente conforme os blocos e dirigentes que disputavam o poder com o “estalinismo” foram capitulando. 
  10. O “trotskismo” também retroalimentou o “estalinismo” com as denuncias contundentes e a constante ameaça de encabeçar os dissidentes que se multiplicavam a cada derrota. (ver 48)
  11. O verdadeiro “estalinismo” estava baseado na força material do estado soviético que era usado pela burocracia soviética para sustentar e aumentar seus privilégios, num caminho que a impulsava a tornar-se burguesia, com a propriedade direta dos meios de produção. Nos anos de 1970, já haviam vários componentes dessa transição, por exemplo com a formação de empresas com os monopólios estrangeiros, principalmente na indústria automobilística, a partir de empresas fachadas que eram formadas em países europeus.
  12. Os “trotskistas” no período anterior à Segunda Guerra Mundial não estiveram à altura das tarefas por causa da pressão do imperialismo. Os principais “trotskistas” foram todos assassinados. Trótski, com a sua autoridade, conseguiu minimizar parcialmente o problema. 
  13. O “verdadeiro trotskismo” existiu quando ele foi encabeçado por Trótski, com suas contribuições, seus erros e principalmente seus métodos. Isso explica a facilidade com que o “trotskismo” entrou em enorme decadência com a morte de Trótski. Se repetiu como tragédia o papel de Lenin à frente da Revolução de Outubro, mas numa situação desfavorável, de refluxo do movimento operário mundial, de endurecimento burocrático do “estalinismo” e sem outros quadros à altura.
  14. León Trosky teve contribuições ao marxismo, realizadas em condições muito duras. A atuação dos agrupamentos autodenominados “trotskistas” após a morte de Trótski foi muito errática no geral, e deve ser analisada caso a caso.
  15. Após a Segunda Guerra Mundial, em cima da brutal pressão da aliança entre o imperialismo e o “estalinismo”, a influência pequeno burguesa sobre os agrupamentos “trotskistas” escalou. (ver 64)
  16. A manutenção das bandeiras revolucionárias da III Internacional Comunista, principalmente após o IV Congresso, que aconteceu em 1922, acabou sendo obra de grupos intelectuais revolucionários, muito desligados da classe operária e que tiveram os principais líderes exterminados até a Segunda Guerra Mundial em todo o mundo. 
  17. A defesa dos princípios programáticos do socialismo científico (ou marxismo revolucionário), frente à prostituição do marxismo promovida pelo “estalinismo” foi mérito de Trótski e de alguns setores do que restou da IV Internacional. Mas as condições em que atuaram, o próprio isolamento e caráter de classe esteve na base da proliferação de importantes desvios oportunistas, fundamentalmente quase ficaram sem os principais líderes.
  18. Os auto-denominados “trotskistas” agrupam desde setores abertamente contrarrevolucionários, a setores mais ou menos revolucionários, ou melhor, neste momento, seriam no geral setores centristas que pretendem ser revolucionários, mas que sofrem enorme pressão do ambiente pequeno burguês que se tornou quase irrespirável depois do aumento da agressividade do imperialismo em crise na década de 1980. E situações bastante similares se repetem na ampla maioria das demais correntes da esquerda revolucionária.
  19. As tarefas colocadas já para este período impõem a necessidade de superar as diversas formas de “socialismo pequeno burguês”, da adoção do método do socialismo científico (marxismo), da assimilação das experiências revolucionárias (principalmente das revoluções derrotadas) e da formação de quadros militantes que superem todos os tipos de burocratismo, inclusive o “burocratismo doméstico”, a priorização dos interesses pessoais em cima dos interesses da revolução proletária mundial.

Trótski até a Revolução de Outubro

  1. Trótski manteve uma atuação centrista, em questões fundamentais, até a Revolução de 1917. Mas é preciso lembrar que na Rússia dos czares os níveis de repressão eram enormes e que nem sequer havia burocracia sindical. 
  2. Esse centrismo se manifestou na adesão aos mencheviques, durante um período, após o II Congresso do POSDR (Partido Operário Socialdemocrata Russo) de 1903; na concepção do partido que, da mesma maneira que Rosa Luxemburgo, era visto como uma organização muito mais laxa que a concepção de Lenin, expressada fundamentalmente em O Que Fazer?; a sobrevalorização do fator objetivo; a tentativa recorrente e fracassada de juntar as várias alas do Partido; o Bloco de Agosto etc.
  3. Trótski foi o principal militante do POSDR (Partido Operário Socialdemocrata da Rússia) no Soviet de São Petersburgo durante a Revolução de 1905. Com a influência de Parvus, socialdemocrata alemão de origem russo, e dos acontecimentos da Revolução de 1905, ele elaborou a Teoria da Revolução Permanente, que representou uma visão teórica da teoria da revolução permanente de Marx e Engels aplicada à época do imperialismo.
  4. Trótski, assim como Rosa Luxemburgo, teve longa atuação na Europa; se opôs à ala direita da socialdemocracia; denunciou a capitulação da socialdemocracia na Primeira Guerra Mundial, adotando imediatamente uma posição internacionalista. A rejeição aos créditos de guerra foi mantida na Rússia também pelos mencheviques e a sua ala esquerda, dirigida por Martov, manteve uma posição internacionalista.
  5. A Revolução de Fevereiro de 1917 pegou os partidos da esquerda revolucionária bastante desestruturados. A confusão se impôs no início. Lenin com as suas Teses de Abril, em cima da avaliação da situação do movimento de massas orientou que a revolução devia continuar porque a burguesia liberal não tinha condições de liderar a revolução democrático burguesa e o partido camponês (os socialistas revolucionários) também não tinham condições de liderar a revolução. Estas Teses levaram a uma enorme polêmica no Partido Bolchevique e acabou se tornando o foco da aglutinação dos revolucionários na Rússia em torno aos Bolcheviques.
  6. Trótski se aproximou do Partido Bolchevique e de Lenin; junto com vários militantes de São Petersburgo, agrupados na organização denominada Inter-rádios, voltou a ter uma participação central no Soviet de São Petersburgo, ingressou no Partido Bolchevique em junho de 1917 e a seguir foi eleito ao Comitê Central. A sua participação na organização da Revolução de Outubro foi central.
  7. Trótski recebeu a incumbência de organizar o Exército Vermelho, do qual se converteu no Comandante em Chefe.
  8. A estas alturas Trótski já tinha abandonado, sob a pressão da realidade, vários componentes centrais da sua política centrista. A começar sobre a importância de organizar o Partido, de acordo com as orientações que Lenin tinha aplicado com sucesso na Rússia, e de deslindar campos com os setores oportunistas. De esta maneira, ele passou de ser um crítico acirrado de Lenin e do “bolchevismo”, a ele próprio tornar-se um dos dirigentes mais destacados do Partido Bolchevique. 
  9. A fragilidade dos novos partidos que se formaram levou a que toda uma série de revoluções fossem derrotadas na Europa, em grande medida por conta do ultraesquerdismo das direções. Foi esse o motivo que levou a Lenin a escrever o famoso livro Ultraesquerdismo doença infantil do comunismo em 1921.

Trótski no início da luta contra a burocratização da União Soviética

  1. Em 1920, o desgaste ocasionado pela Guerra Civil, levou a vários levantes de massas contra o governo soviético. O principal deles foi o dos marinheiros de Kronstad, quando, ao mesmo tempo, aconteciam umas 50 insurreições camponesas. A indústria estava desmantela e a infraestrutura liquidada. Era preciso fazer funcionar a economia; sob a direção de Lenin foi aprovada e aplicada a política da NEP (Nova Política Econômica).
  2. O Estado Soviético e o Partido Comunista sofriam enorme burocratização e até se confundiam. A crise e o atraso, a desmobilização do Exército Vermelho, o fortalecimento dos kulaks (camponeses ricos); as necessidades da guerra: estes fatores principais, e outros, levaram à aparição de uma camada social burocrática que se elevou por cima das classes sociais buscando fortalecer os próprios privilégios. A burocracia elegeu seus representantes políticos, a começar pelo próprio Stalin por conta da autoridade que ele tinha como antigo Bolchevique, muito dedicado às atividades práticas.
  3. Trótski deixou o comando do Exército Vermelho, no final de 1924, no meio da enorme campanha contra o “trotskismo”, negando-se a adotar qualquer política putschista contra a burocracia, sabendo que essa política somente a fortaleceria.
  4. Da chamada Oposição de Esquerda, participaram dirigentes de primeiro nível e autoridade do Comitê Central do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), como Cristian Rakovsky, Ivan Smirnov (quem tinha encabeçado a derrota de Kolchak), Smilga (um dos dirigentes da Revolução de Outubro), Preobrazhensky e vários outros. Stalin, que à época era o Secretario do Comitê Central do PCUS (um cargo que quando ele foi eleito não tinha uma importância tão central) fortalecia o seu próprio grupo, e se aliava ao grupo de Kamenev (tinha sido membro do Birô Político e adjunto de Lenin) e Zinoviev (tinha sido presidente da III Internacional Comunista), e ao grupo de Bukharin.
  5. Desta época, data a aparição do “leninismo” e do “trotskismo”. O “leninismo”, como a herança da política de Lenin, passou a ser disputado entre as várias alas do Partido, até sob a pressão da burocracia, neste caso, no sentido de que tudo o que era feito era a aplicação dos ensinamentos de Lenin. Sob essa pressão, o próprio Trótski encampou a defesa do “leninismo” e do “bolchevismo” contra os setores centristas e a ala direita do Partido. O “trotskismo” foi uma invenção de Kamenev, Zinoviev e Stalin para contrapô-lo ao “leninismo”. Também em cima dessa pressão, que se tornou crescente até o nível do insuportável, passou a ser gradualmente defendido pelo próprio Trótski, principalmente a partir de 1928.
  6. Após a saída do comando do Exército Vermelho, Trótski passou a atuar no setor da economia que era o principal calcanhar de Aquiles do Poder Soviético. Coube a Trótski e a Preobrazhensky o mérito de terem analisado o problema e terem elaborado as teses da chamada acumulação socialista primitiva, que implicava industrializar o país a partir de impostos à produção agropecuária. Mas na base dessa política estava a premissa da existência de produtos industriais para oferecer em troca aos camponeses, assim como a política das granjas estatais e das cooperativas que deviam ter na base o apoio tecnológico, o exemplo das vantagens, e não a coerção.
  7. A partir de 1925, houve um claro giro à direita dos setores que controlavam a Direção do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) e do Estado. Era a continuidade da política da aliança com setores oportunistas e com a burguesia, que tinha tomado uma certa forma no apoio inicial ao Governo de Kerensky. Tratava-se de um reflexo da política de auge da NEP, que teve a expressão máxima nas palavras de Bukharin “kulaks enriquecei-vos”.
  8. Trótski ficou um tanto afastado durante quase dois anos do centro da luta partidária no Comitê Central, embora tenha intervindo em várias discussões centrais relacionadas com as questões econômicas e algumas questões políticas centrais. Como reflexo da virada oportunista do PCUS, aconteceram derrotas centrais na Internacional Comunista. Em 1926, com a derrota da greve geral na Inglaterra, principalmente por causa da aliança com a burocracia sindical. Em 1925-1927, por causa da política muito errática aplicada na China, principalmente no que se relacionava em se colocar a reboque do Kuomintang.
  9. Com o aumento da pressão dos kulaks, que ameaçavam liquidar o poder soviético com o aumento das tendências restauracionistas, se fortaleceram e dos novos setores burocráticos e as novas derrotas em escala internacional, Kamenev e Zinoviev rompem com os grupos que dominavam a Direção do PCUS, os “estalinistas” e “bukharinistas”.
  10. A Oposição Unificada, liderada por Trótski aliado a Zinoviev e Kamenev, se formou em 1926 e foi derrotada pelo bloco dos “estalinistas” e “bukharinistas” em 1927, no XV Congresso do PCUS. Trótski foi expulso do Partido, em 1928, e exilado, em 1929, assim como aconteceu com vários outros dirigentes. Além dos mecanismos de coerção, o principal componente do “estalinismo” para quebrar a Oposição foi a “virada à esquerda”, imposta pelo I Plano Quinquenal, que passou a aplicar parte do programa da Oposição, embora que o fizesse por meio da força bruta. Havia um ambiente generalizado de véspera de guerra civil, com o risco aberto colocado pelo “restauracionismo” impulsionado principalmente a partir dos kulaks. A capitulação de Karl Radek e Preobrazhensky, em 1929, foi vergonhosa e de submissão total; as dos demais ex dirigentes bolcheviques (Ivan Smirnov, Mrachkovsky, Beloborodov, Ter-Vaganian, Boguslavsky, dentre outros) que capitularam a seguir foi mais moderada, ainda planteando críticas à política “estalinista”. Cristian Rakovsky conseguiu agrupar uma parte dos ex dirigentes contra a pressão da burocracia. Publicaram uma Carta Aberta ao Comitê Central onde chamavam apoiar a campanha de industrialização nas massas e na democratização do Partido e do poder soviético, contra a política do “socialismo num só país”.
  11. A forte virada de 1928 do PCUS, que a estas alturas se encontrava amplamente integrado ao aparato do estado, teve fortes efeitos no VI Congresso da Internacional Comunista, quando foi inaugurado o chamado “terceiro período”. Na União Soviética, era a luta contra os kulaks, com o objetivo de liquida-los como classe social. Em escala internacional, era a luta pela tomada imediata do poder, contra a direita e a socialdemocracia que passaram a ser considerados como inimigos no mesmo nível. Esta política levou a um importante acirramento da luta de classes e ao fortalecimento do poder da burocracia soviética encabeçada pelo grupo de Stalin. Trótski escreveu a respeito, desde Alma Ata, A internacional Comunista depois de Lenin e Critica do Projeto do Programa da Internacional Comunista.

Trótski na luta contra a consolidação do “estalinismo

  1. Em 1928, foi aprovado o I Plano Quinquenal. Tratou-se da adoção parcial das teses da Oposição de Esquerda no sentido da industrialização, mas adaptadas à realidade da luta de classes no momento. A coletivização da agricultura foi imposta por meio da força brutal e sem base tecnológica adequada; isto levou a uma catástrofe da qual a União Soviética demorou muitos anos para recuperar-se, o que nunca o conseguiu, dado que as necessidades de produtos agropecuários tinham aumentado. Os camponeses sacrificaram dezenas de milhões de animais o que provocou muitas mortes por fome. O stakhanovismo representava o aumento da pressão sobre os trabalhadores para atingirem as metas, aumentando o ritmo do trabalho e usando em primeiro lugar incentivos materiais. Haviam grandes diferenças salariais e foram restituídos os graus militares no Exército.
  2. Se criou um enorme confusionismo nas fileiras da Oposição. Começaram as capitulações dos oposicionistas, e dos dirigentes um após o outro. A partir desta época o controle da Internacional Comunista pela burocracia soviética escalou e se tornou absoluto, impondo nas direções agentes de Moscou. A substituição dos dirigentes por agentes da burocracia soviética, por meio de purgas, se generalizou.
  3. Em 1929, Trótski foi expulso da União Soviética para Turquia. Nesse mesmo ano, ele escreveu Minha Vida, com o objetivo de contrapô-lo à campanha de calúnias pessoais como componente da campanha geral contra o “trotskismo” que incluía a toda a antiga Oposição de Esquerda e os militantes que não haviam capitulado à burocracia. Em 1931, Trótski escreveu a História da Revolução Russa, que é um livro muito interessante porque, além da qualidade literária, trata da história escrita por um dos seus principais protagonistas. Mas chama a atenção a exaltação do próprio papel na Revolução Russa para contrapô-lo à campanha do “estalinismo”. Com a publicação dos seus escritos, Trótski foi gerando recursos com os quais se sustentou nos próximos anos. Até 1932, os oposicionistas ainda contaram com uma certa liberdade de comunicação, que acabou totalmente fechada. A expectativa de Trótski de que houvessem outros revolucionário russos exilados para formar um centro de direção forte não aconteceu.
  4. Em 1932, o acirramento da luta de classes interna levou à liquidação pela força dos kulaks como classe social. O último dirigente bolchevique antigo que não tinha capitulado, Cristian Rakovsky, capitulou em 1933. As comunicações de Trótski com a União Soviética se fecharam.
  5. A União Soviética se transformou num barril de pólvora, com as contradições sociais muito exacerbadas e com reflexos em todos os componentes da sociedade. A classe operária aumentou em termos numéricos, mas não havia bens de consumo suficientes e as condições de trabalho eram muito precárias. A indústria leve sempre foi muito frágil. Os incentivos para aumentar a produção estiveram baseados em prêmios materiais, que estão na base do chamado stakhanovismo. A destruição dos kulaks pela força não poderia ter passado ser ter deixado reações posteriores e sabotagens. Haver cooperativizado a propriedade individual pela força e sem a tecnologia necessária, além de ter produzido a fome generalizada, provocada pela matança indiscriminada de animais, levou a que os níveis de produção de 1928 somente fossem alcançando depois da Segunda Guerra Mundial. Além disso, concentrou também as contradições provenientes da pressão do imperialismo mundial, principalmente a partir da crise de 1929. Em 1931, Stalin disse que a União Soviética havia entrado “na época do socialismo”. A política do “socialismo num só país” gerou uma espécie de Frankenstein que esteve à beira da implosão em várias ocasiões.
  6. Em 1933, aconteceu a vitória do nazismo. O PCA (Partido Comunista Alemão), que tinha um milhão de membros foi desarticulado em um mês sem que houvesse qualquer resistência. A III Internacional não falava nada, a não ser que a política tinha sido acertada. A política que Trótski tinha orientado para derrotar o nazismo, que era a frente única entre o PCA e do Partido Socialdemocrata, foi totalmente ignorada. O impacto e desmoralização aumentaram enquanto a influência de Trótski aumentava. Até este momento Trótski tinha continuado se considerando militante do PCUS e da III Internacional. Neste momento, aconteceu o rompimento político, embora continuasse considerando a União Soviética um “estado operário deformado”.
  7. A campanha contra o “trotskismo” escalou, na União Soviética e no mundo. Qualquer dissidência era catalogada como “trotskismo”. Trótski era o único dos dirigentes da Revolução de Outubro que ainda estava livre e com capacidade de realizar críticas contundentes contra o processo de burocratização da União Soviética. Trótski era visto como a grande ameaça, e os “trotskistas” passaram a ser perseguidos com muita repressão pela GPU.
  8. Em 1934, se formou a frente popular na Espanha, com a participação do PCE (Partido Comunista Espanhol), numa clara amostra do novo giro à direita que estava se materializando. Um dos últimos estertores da política do chamado “Terceiro Período” foi a Intentona de 1935, no Brasil, uma espécie de putsch militar do PCB, encabeçada pelos tenentes, que nem sequer tinham visto a Revolução de 1930, e que acabou num tremendo fracasso.
  9. Depois de 1934, não tinha sobrado quase ninguém dos “trotskistas” na União Soviética, mas Trótski acabou se convertendo na única grande figura opositora, o “subversivo” contra o regime soviético burocratizado, a partir da capitulação de Cristian Rakovsky em 1934, e, em consequência, o principal alvo da burocracia soviética. E aconteceu sob o aumento da repressão “estalinista”, o avanço do fascismo e a paralisia da classe operária russa. A paralisia se explica pelo enorme desgaste gerado pela guerra civil e as enormes transformações que vieram a seguir; depois de praticamente ter quase desaparecido em quanto classe social, a maior parte da nova classe operária era composta por antigos camponeses e até pelos kulaks expropriados. 
  10. Em 1935, aconteceram dois fatos muito importantes. O VII Congresso da Internacional Comunista consolidou o giro à direita com a validação das frentes populares, como encarnação da política de conciliação de classes e do “etapismo”. Agora era preciso deixar de lado a luta contra o socialismo e juntar forças com os setores democráticos da burguesia e do imperialismo para derrotar Hitler. O assassinato de Serguei Kirov, o principal dirigente do PCR (Partido Comunista da Rússia) em São Petersburgo, detonou uma caçaria às bruxas que atingiu até os setores “estalinistas”. Stalin se elevou como um Bonaparte, consolidando o Termidor que vinha desde pelo menos 1924. Os processos de Moscou aconteceram, não por coincidência, após Hitler ter entrado na Renânia e a Frente Popular ter triunfado na França; o objetivo era usar o medo de Hitler e do nazismo como ameaça e ainda mostrar aos novos aliados imperialistas a ruptura definitiva com a revolução eliminando fisicamente a quem a tinha dirigido. A União Soviética não poderia ser questionada já que era um dos suportes do novo governo francês, por meio do PCF (Partido Comunista Francês). Neles, foram liquidados praticamente todos os dirigentes do Partido Bolchevique de 1927, dos quais somente três dos antigos dirigentes do Comitê Central (Sverdlov, Lenin e Stalin) não foram assassinados. Milhares de oposicionistas foram assassinados nos campos de prisioneiros, como no famoso genocídio no campo da mina de carvão de Vorkuta. Setores do “estalinismo” também foram expurgados na tentativa de conter o acirramento das lutas de classes interno que impulsionava o surgimento de uma nova burguesia restauracionista a partir da própria burocracia que se valia do controle dos aparatos para manter e aumentar os privilégios. O Exército Vermelho sofreu a purga de aproximadamente 25 mil oficiais, o que revelou a profundidade das rachaduras internas do regime. Também foram expurgados 1.108 dos 1968 delegados ao XVIII Congresso do PCUS e 98 dos 139 membros do Comitê Central do PCUS. A caçaria às bruxas foi estendida a militantes dos partidos da Internacional Comunista estrangeiros que moravam na União Soviética e fora dela, e obviamente aos militantes da IV Internacional.
  11. Durante a década de 1930, houveram grandes polêmicas entre os opositores ao “estalinismo” sobre o caráter da burocracia soviética. Alguns setores levantavam que na União Soviética, havia um capitalismo de estado o que implicava na existência de uma burguesia. Em 1930, Rakovsky escreveu um relatório sobre a real situação na União Soviética. Em 1932, Ivan Smirnov, numa viagem a Europa, vazou uma série de documentos sobre a verdadeira situação interna existente na União Soviética, que foi publicada meses depois no Boletim Internacional da Oposição . As cadeias e campos de concentrações se encheram de oposicionistas. Em 1936, Victor Serge e Ciliga foram expulsos/ expatriados da União Soviética, e Davtian-Tarov fugiu via Pérsia; os três tinham passado pelos gulags, as duras prisões da burocracia soviética, e tinham sido submetidos aos duríssimos métodos usados pela GPU para extrair “confissões”. Houve as deserções de outros altos funcionários, como Ignace Reiss e Krivitsky, que também aportaram novas informações. Com essas informações e o acúmulo anterior, Trótski escreveu uma das suas obras mais importantes, A Revolução Traída, de 1937, onde caracterizou teoricamente a burocracia soviética, o estado soviético, a partir das suas contradições internas e evolução. 
  12. Na segunda metade da década de 1930, uma série de acontecimentos geraram enorme confusão no campo revolucionário. A greve geral na França e sua contenção por meio da Frente Popular. A derrota da Revolução Espanhola com a cumplicidade da burocracia soviética. Os processos de Moscou, onde foi liquidada quase toda a alta cúpula dos bolcheviques que dirigiram a Revolução de Outubro, e a “Grande Purga”, que além de ter liquidado com setores ligados ao próprio Stalin, eliminou 25 mil altos oficiais do Exército Vermelho. O acordo Molotov-Ribentropp (Hitler-Stalin), que Trótski não havia repudiado frontalmente, pois direcionava a crítica no sentido de que Stalin não somente empreendia alianças, mas passava a impulsionar a solidariedade ideológica com o aliado. A invasão e repartição de Polônia. O início da Segunda Guerra Mundial, com uma reação hiper morna do imperialismo francês e inglês, e a neutralidade do imperialismo norte-americano. A falida invasão da Finlândia pela União Soviética. A escalada da propaganda imperialista contra o comunismo e o socialismo, que colocou enorme pressão também contra os simpatizantes e a intelectualidade em geral. Trótski continuou mantendo a caraterização da União Soviética como um estado operário deformado e apoiou a invasão da Finlândia pela União Soviética. O grande racha aconteceu no SWP norte-americano, no qual Trótski participou diretamente; os documentos da polêmica estão compilados no livro “Em Defesa do Marxismo”.

Trótski como organizador da luta contra a Segunda Guerra Mundial

  1. A Europa avançava rapidamente rumo a um novo confronto em grande escala. Trótski via a necessidade de preparar a resistência por meio da criação de partidos operários revolucionários.
  2. Os seguidores do “trotskismo” eram no geral muito fracos e submetidos às fortes pressões da lucha de classes que estava se exacerbando em forte escala. Na Alemanha, haviam alguns “trotskistas” e outros que se aproximaram a Trótski depois da vitória de Hitler, mas muito pouco sobrou por causa da enorme pressão política. 
  3. Em  1936, aconteceu a greve geral na França, que reforçou a luta da classe operária na Espanha, e que serviu de contraponto à vitória de Hitler. Portanto, havia a retomada do movimento operário, que justificava o grande esforço do Trótski dos últimos anos para reagrupar os revolucionários com o objetivo de prepara-los para o choque de classes que a Segunda Guerra Mundial iria inevitavelmente produzir. A política do “entrismo” nos partidos socialistas, durante um período, mantendo a independência política e com o objetivo de aproximar-se da classe operária, esteve na base de grandes discussões e rachas. Os enormes esforços de Trótski enfrentaram enormes dificuldades, principalmente na França, em primeiro lugar, por causa do caráter pequeno burguês e sectário da enorme maioria dos seguidores ou candidatos a seguidores. O objetivo relativamente simples pelo qual Trótski se esforçou muito a partir de 1929, ter “um grande semanário agressivo”, nunca foi alcançado.
  4. A contenção do ascenso operário e revolucionário aconteceu, fundamentalmente, por meio de uma operação em pinça: por um lado os fascistas e pelo outro o “estalinismo” por meio da política de frente popular. O resultado foi a derrota da revolução na Espanha e do ascenso operário na França, junto com uma espécie de “greve militar” pelo imperialismo francês e inglês, junto com a neutralidade dos Estados Unidos, que permitiu o controle da Europa por Hitler. O movimento operário e a esquerda ficaram paralisados na Europa apenas esperando serem massacrados pelo nazismo.
  5. Em cima da brutalidade da pressão reacionária, que vinha de várias fontes, e do refluxo do movimento operário, o movimento revolucionário ficou muito acuado. As tendências pequeno burguesas se tornaram na norma. O hippiesmo dos grupos “trotskistas” na maioria dos países, foi às alturas, a começar pela França. Na Alemanha, praticamente desapareceu a esquerda como um todo. Na Espanha, os revolucionários foram massacrados ou por Franco ou pela República, e concretamente pelos agentes de Moscou, a começar pela GPU. Nesse contexto, Trótski elaborou a política do “entrismo” nos partidos socialistas que abriam a possibilidade de defender o programa revolucionário e manter a independência política; o objetivo era participar por um período para se vincular à classe operária. Essa política também gerou grandes polêmicas, disputas e rachas, apesar do sucesso alcançado por alguns grupos que a aplicaram.
  6. O país onde o “trotskismo” parecia ir se consolidando era os Estados Unidos com o recém formado SWP (Socialist Workers Party) norte-americano, que tinha alguns milhares de membros e trabalho na classe operária. Mas até ali a crise estourou sob a pressão generalizada após a fracassada invasão da Finlândia pela União Soviética. A pressão fez aflorar todo tipo de grupos pequeno burgueses, apesar da enorme autoridade de Trótski; muitos deles, ou a ampla maioria, se enfrentaram ao próprio Trótski. Após a Comissão Dewey, que acabou inocentando Trótski das acusações dos processos de Moscou, o distanciamento de Trótski aumentou mais ainda. Uma coisa era defender Trótski das alopradas acusações da burocracia soviética, obtidas por meio de “delações premiadas” (que hoje conhecemos muito bem); outra adotar na prática o Programa da IV Internacional. A pressão foi tanta que alguns revolucionários mais antigos, como Victor Serge, Ante Ciliga, Souvarine e Eastman, em pleno 1938, no meio da campanha contra os Processos de Moscou, saíram com a crítica de que Trótski teria sido o responsável pela repressão à rebelião em Cronstadt; como resposta Trótski escreveu o famoso folheto A sua moral e a nossa. O rompimento com o famoso muralista mexicano Diego Rivera, aconteceu em 1939, quando Rivera apoiou um general direitista, Almazán, contra a reeleição do então presidente, o general Lázaro Cárdenas.
  7. Trótski acompanhou com certo cuidado a situação na Ásia, principalmente no Japão, China, Índia, Indochina, Indonésia e Ceilão (hoje Sri Lanka). No Oriente, houve um trabalho revolucionário importante no Vietnam, Ceilão (hoje Sri Lanka), Indonésia e na China. Em Ceilão, se formou um partido importante, mas que acabou capitulando para a política de frente popular. Na China, havia o isolamento provocado pela repressão dos japoneses, o Kuomintang e a GPU. Chen Tu-hsiu, o ex secretario geral até 1927, viveu sob muita pressão, passou seis anos de prisão e foi assassinado em 1943; ele se desmoralizou, inclusive devido à fragilidade e sectarismo dos “trotskistas” chineses. O rompimento de Chen Tu-siu (o principal dirigente do Partido Comunista Chinês até 1927) com a burocracia soviética teve muita importância. Chen publicou uma Carta Aberta, em 1929, contra a burocracia soviética. O aumento da pressão do Kuomintang, liderado pelo general Chiang Kai Shek, e a política do imperialismo japonês de liquidar com as indústrias nas cidades costeiras acabaram liquidando o movimento revolucionário, transformando-o em pequeno grupos. Havia proximidade com uma aliança com Mao, mas não houve avanço. O grupo de Mao Tse Tung representou um agrupamento de revolucionários agrários que se fortaleceu no norte do país, que não tinha sido infiltrado pelos agentes de Moscou, que depois de 1945 tentou aplicar a política da frente popular, mas a enorme pressão dos camponeses na prática a implodiu e acabou impondo a sua vitória. A fragilidade dos “trotskistas” lhes impediu avançar na aliança tática com os maoístas, principalmente em cima da importante avaliação política realizada por Chen em 1929, sobre o desmantelamento da indústria pelos japoneses nas cidades costeiras. No Vietnam, os “trotskistas”, que tiveram uma atuação muito importante até pelo menos 1940, foram massacrados pelas forças do Viet Min; seria necessário avaliar se neste caso, também não teria havido problemas com a elaboração da política ou se simplesmente os “trotskistas” foram liquidados dentro da campanha mundial de caçaria às bruxas desatada pela burocracia soviética a partir dos Processos de Moscou e pelo fascismo, ou ambos.
  8. Os esforços realizados por Trótski para pôr em funcionamento a IV Internacional nunca saíram do chão. O lançamento em 1938 somente contou com a participação de agrupamentos da fração ligada a Trótski. O Burô Internacional, formado em 1930, e o Secretariado Internacional nunca funcionaram como tais, além de terem vivido em continuo conflito. Trótski funcionava como árbitro nesta e nas recorrentes e intermináveis discussões e desavenças que aconteciam entre os grupos “trotskistas” pelos motivos mais insignificantes. 
  9. A expectativa de Trótski era que a forte influência pequeno burguesa nos grupos “trotskistas” fosse superada pela força das suas ideias (do próprio Trótski) que conforme a situação política fosse evoluindo deveriam se impor e, com isso, seria mantida a continuidade do marxismo revolucionário, do bolchevismo leninista. Era uma situação muito diferente da que existia no período anterior quando havia muitos quadros revolucionários provados, de alto nível teórico, ideológico e político. Agora era a vez da diletância pequeno burguesa perante uma situação política que a cada dia se tornava mais crítica. Neste contexto, fortaleceu-se o personalismo de Trótski, que aumentava ainda mais, conforme se consolidava a truculência da burocracia soviética e, especificamente, do “estalinismo”. Na União Soviética, os quadros de grande valia passaram a ser exterminados fisicamente em campos como Tobolsk ou nas minas de carvão de Vorkuta. 
  10. O aumento da pressão da burocracia soviética teve como base social a pressão do acirramento da luta de classes. Stalin passou a perseguir os próprios estalinistas. A existência física de Trótski tinha se mostrado insustentável para o burocracia soviética por causa das denuncias realizadas por alguém com a sua autoridade numa situação em que as dissidências tendiam a se avolumar. Em 1940, Trótski, após várias tentativas, foi assassinado, da mesma maneira que o foram todos os seus filhos e genros. Um ponto de destaque é que a morte do filho, Sedov, esteve relacionada com um agente da GPU de apelido Etienne que não só foi o elo responsável pela morte de vários militantes importantes como também chegou a ocupar o lugar de Sedov e a participar da Direção da IV Internacional. A história voltava a repetir-se de maneira trágica num engano similar ao que tinha acontecido com Lenin em relação ao provocador Malinovsky que chegou a ser o líder da bancada bolchevique na Duma e membro do Comitê Central, sob uma certa proteção do próprio Lenin.
  11. A que seria a sua obra máxima, Lenin, onde Trótski pretendia, além de tratar da obra política de Lenin, fazer uma profunda exposição do materialismo dialético, nunca chegou a ser realizada. Os manuscritos do livro Stalin, que não chegou a ser concluído, são interessantes e contêm muitas colocações valiosas, mas ao mesmo tempo, do jeito que ficaram, adolescem de muito subjetivismo, até compreensível ao calor da luta que estava acontecendo naquele momento, após os Processos de Moscou, com acusações escandalosas, posteriormente desmentidas pela Comissão Dewey, e o assassinato dos filhos e genros, e ele próprio estar prestes a ser assassinado.
  12. Trótski confiava na força com que a guerra contrarrevolucionaria iria parir a revolução na Europa e na própria Rússia. Os “trotskistas” que sobraram após a Guerra iriam entrar em crise porque a revolução não teria acontecido e, desta maneira, as previsões do “mestre bruxo” não teriam se concretizado. Na realidade, as tendências revolucionarias foram muito desenvolvidas na França, Itália e Grécia; a revolução triunfou na Iugoslávia e em Albânia; na Europa Oriental, a burguesia tinha sido expropriada pelos nazistas. O grande fator contrarrevolucionário de estabilização foi o “estalinismo”, que saiu da guerra muito fortalecido. 

O “trotskismo” após a Segunda Guerra Mundial

  1. Após a Segunda Guerra Mundial, os movimentos revolucionários foram contidos por meio dos acordos realizados entre o imperialismo e a burocracia soviética, a partir das três grandes conferências. Agora, mais uma vez, “era a vez da democracia” (burguesa e imperialista). Assim, foram derrotadas as revoluções na França, na Itália, na Grécia e em toda a Europa Oriental; nesta última foi imposto o modelo da União Soviética a partir de 1948, quando começou o Plano Marshall e a chamada Guerra Fria. No enorme esforço de contenção conjunto da revolução, escaparam do controle as revoluções na Iugoslávia e na Albânia, e as revoluções nos países atrasados, em primeiro lugar, na China e na Indochina, assim como as revoluções anti-coloniais.
  2. O “estalinismo”, longe de ter sido derrotado, aparecia como o grande responsável pela derrota do nazismo. A figura de Stalin ficou eclipsada. Os erros graves do período anterior ficaram eclipsados. A figura de Trótski praticamente sumiu do mapa e os “trotskistas” entraram em tremenda confusão.
  3. Após a Segunda Guerra Mundial, em cima da brutal pressão da aliança entre o imperialismo e o “estalinismo”, a influência pequeno burguesa sobre o “trotskismo” escalou. Com a “Guerra Fria” e o Marcarthismo, a pressão aumentou ainda mais. Houve um fôlego após a crise do “estalinismo” aberta com o XX Congresso do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), de 1956, com os movimentos de 1968 e o ascenso operário da década de 1980, mas sempre com muita influência da política e ideologia pequeno burguesas. Além de alguns lampejos de ação revolucionária, e principalmente de defesa do Programa, há muito pouca coisa que possa ser reivindicada das várias “internacionais” que têm reivindicado a IV Internacional. Depois de 1989, o “trotskismo”, assim como aconteceu com toda a esquerda mundial, entrou em enorme crise, fragmentação e/ou estado de gueto.
  4. Os “trotskistas” pós Segunda Guerra Mundial foram dominados por agrupamentos pequeno burgueses, muito parecidos aos que Trótski tentou disciplinar no período anterior à Guerra, mas muito piores já que existia mais a figura do grande mestre. Na nova situação, prevaleceram grupos desligados do movimento operário e os dirigentes não conseguiram entender a nova situação. 
  5. As caraterizações erradas do que se tornou o “Pablismo” levaram a políticas consequentemente erradas, que estiveram na base da derrota da Revolução Boliviana de 1952, os rachas e mais rachas sucessivos, e o desligamento quase total da política real. No geral, praticaram uma caricatura das políticas de Trótski, com muito dogmatismo e sectarismo, ficando paralisados quando alguma das “previsões” de Trótski não tinha se confirmado. 
  6. O “entrismo” aberto nos partidos socialistas, não centralizados e com base de massas, por um breve período e mantendo a independência, foi transformado em “entrismo” clandestino nos partidos “estalinistas” porque se supunha iria acontecer uma terceira guerra mundial, que provocaria revoluções que seriam dirigidas pelos “estalinistas”. O “entrismo” no Partido Laborista Britânico, o PT Brasileiro ou o chavismo e outros foi transformado em integração eterna. 
  7. A figura do “grande líder” e “super gênio” tem sido recorrente em todos os partidos e agrupamentos “trotskistas”, com grande desprezo à direção coletiva e política de formação de quadros. Essa situação, que é uma expressão do burocratismo pequeno burguês, é ainda mais críticas nos partidos integrados ao regime por meio da burocracia sindical, do movimento de massas.
  8. O aprofundamento da crise na União Soviética e o acirramento da luta de classes levou ao XX Congresso do PCUS, em 1956, às catastróficas reformas na agricultura e ao direcionamento da economia para a produção de petróleo e gás por Leonid Brezhnev, que acabou se transformando num dos fatores que estiveram na base da implosão da União Soviética, impulsionado pela crise mundial do petróleo de 1974. Khruschev chegou a declarar, parodiando a Stalin em 1931, que a União Soviética alcançaria o comunismo em 20 anos.
  9. O acirramento da luta de classes nos países da Europa Oriental levou às revoltas de 1953 (dos operários de Berlim Oriental); em 1956, na Hungria (onde até existiram soviets) e na Polônia; em 1968, na Tchecoslováquia; em 1971 e 1976, novamente na Polônia; em 1980, a revolta operária na Polônia que se início na enorme greve dos estaleiros de Gdansk. O levante operário e a pressão do imperialismo a partir do Afeganistão, que tinha sido invadido de maneira defensiva pelos soviéticos em 1979, e por meio da pressão sobre os preços do petróleo, assim como o endividamento generalizado desses países, levou ao fortalecimento dos setores restauracionistas da burocracia soviética, o que se plasmou na política da Glasnost e da Perestroika durante o governo liderado por Gorbatchev.
  10. Sob as novas condições abertas em 1956, os principais grupos “trotskistas” se reagruparam em 1963, no Congresso de Reunificação da IV Internacional. Houve uma nova orientação no sentido da discussão e a luta pela revolução mundial, superando, parcialmente, a mera discussão doutrinária contra o “estalinismo”. Houve avanços entre a juventude, mas foram pequenos no movimento operário, com a exceção da Argentina. Os dois partidos “trotskistas” principais, à época, eram o SWP (Socialist Workers Party) norte-americano e a LCF (Liga Comunista da França). O SWP, sob a pressão do Macarthismo tinha perdido a base operária e detinha alguma influência em setores da intelectualidade e da luta feminista. A LCF chegou a ter uma participação importante no Maio Francês de 1968, manteve o foco principal no movimento estudantil, influência pela teoria mandelista das “novas vanguardas”. Nos Estados Unidos, o SWP perdeu a base operária após a Guerra e ficou muito acuado sobre a pressão do Macarthismo. A LCF se integrou ao ultra oportunista NPA, o novo partido anti-capitalista francês.
  11. Os “trotskistas” europeus nunca conseguiram sair do gueto. Quando o fizeram foi para cair nos braços do oportunismo. Esse foi o futuro do mandelismo, do lambertismo ou do cliffismo por exemplo. Quando não houve a integração ao regime, nos pequenos grupos marginais que sobraram, houve uma clara priorização das questões pessoais sobre as questões partidárias; uma espécie de “burocratismo doméstico”. 
  12. A partir dos movimentos de 1968, a integração a movimentos pequeno burgueses disparou. Isso foi teorizado por Ernest Mandel em relação às ditas “novas maiorias”.
  13. Na América Latina, cresceu o chamado “morenismo”, liderado por Nahuel Moreno no GOM (Grupo Operário Marxista), depois PRT (Partido Revolucionário dos Trabalhadores), depois PRT-Verdade, depois PST (Partido Socialista dos Trabalhadores). O mérito de Moreno foi ter transformado o “trotskismo” argentino de uma corrente política de botequim num partido vinculado à classe operária. Mas o “morenismo” também sofreu muita influência da pressão do imperialismo da época. A política do “entrismo” nas 62 Organizações Peronistas rapidamente enfocou o “morenismo” fundamentalmente numa política sindical, com o objetivo fundamental de controlar aparatos, o que foi mantido pelos “morenistas” na década de 1980 e até hoje. A partir de 1982, a derrapada para o oportunismo aberto foi muito rápida. Na Escola de Quadros de 1984, Moreno saiu com a teoria da “revolução democrática”, abertamente etapista, para justificar a adaptação ao “democratismo” pós Ditadura Militar. Após a morte de Moreno, em 1987, o MAS (Movimento ao Socialismo) e a LIT-QI (Liga Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional) implodiram em vários pedaços. E a partir das Teses de 1990, a explosão e o oportunismo escalaram.
  14. De acordo com Moreno na Escola de Quadros de 1984: “Precisamos formular que não é obrigatório que seja a classe operária e que seja um partido marxista revolucionário com influência de massas quem dirija o processo da revolução democrática na direção à direção socialista”. A revolução avançaria em cima das condições objetivas e devido ao aprofundamento da crise capitalista mundial, subestimando a formação do partido operário revolucionário, separando as revoluções nacionais da revolução proletária mundial
  15. Sobre o FUR (Frente Única Revolucionária), Moreno seguiu o caminho do pablismo e do lambertismo, com a teoria da “tática privilegiada” para toda uma etapa: “Para nós, a frente única revolucionária não é uma tática mais, entre outras várias conjunturais, para construir partidos revolucionários de massas. Para nós, é a tática privilegiada nesta etapa, que nós definimos como cada vez mais aguda, mais grave, e que se combina com a crise dos aparatos revolucionários.” O problema de plantear uma tática privilegiada em escala mundial para todo um período é que a deixa à beira de transformar-se em estratégia.
  16. Os princípios que Moreno pôs para o FUR, embora nunca tenha sido colocado em prática, foram limitados: “Independência dos sindicatos (a respeito) do Estado em todos os países. Democracia operária. Nenhum apoio aos governos burgueses. Contra a diplomacia secreta. Contra a polícia burguesa.” Faltou a necessidade de lutar pelo poder dos conselhos operários e camponeses, o derrocamento revolucionário do estado burguês, a luta contra o oportunismo de todos os tipos e contra as frentes populares. A falta de política revolucionária carrega o risco da dissolução dos revolucionários na FUR.
  17. Sobre a “revolução democrática”, que representou o ápice do oportunismo de Moreno: “Pareceria que o fato da contrarrevolução capitalista há recolocado a necessidade de haver uma revolução democrática. E que ignorar que o que está planteado nos países adiantados onde há regimes contrarrevolucionários também é uma revolução democrática, é maximalismo, é tão grave como ignorar a revolução democrático burguesa nos países atrasados. Isto é muito importante. Não sei se é correto ou não. Se é correto, é preciso mudar toda a formulação das Teses da Revolução Permanente. Tenho a impressão de que é correto é de que Trótski apontava para além. Se é correto, muda toda a nossa estratégia a respeito dos partidos oportunistas, e em boa medida a medida dos partidos burgueses que se opõem ao regime contrarrevolucionário. Como um passo rumo à revolução socialista, nós estamos a favor que venha um regime burguês totalmente diferente (ao regime contrarrevolucionário). Assim como estávamos a favor da revolução democrático burguesa, e dizíamos que era distinta à outra, (à revolução socialista), que era necessário faze-la, que era necessário derrubar o Czar, que era uma tarefa democrático burguesa específica, que é tirar o regime contrarrevolucionário para que venha, embora seja, um regime burguês.” A “revolução democrática” de Moreno é colocada pela contrarrevolução burguesa. Seria uma revolução no tipo de governo para obter “liberdades democráticas”. Seria uma etapa objetivamente nova da revolução, com o seu próprio programa. O Programa de Transição somente se aplicaria após a queda do regime ditatorial. Moreno generaliza assim a própria experiência e avaliação da queda da Ditadura Militar na Argentina, a partir da qual o próprio oportunismo escalou: “primeiro derrotar o regime contrarrevolucionário, depois lutar contra as chagas do sistema”. Trótski se posicionou claramente em contra do etapismo, como pode ser visto no caso da Revolução Russa ou na luta contra o bonapartismo em Aústria ou na Revolução Espanhola, a frente popular na França ou contra o fascismo.
  18. No texto “Revoluções do Século XX”, Moreno escreveu: “O que Trótski não planteou, apesar de ter feito o paralelo entre o “estalinismo” e o fascismo, foi que também nos países capitalistas era necessário fazer uma revolução no regime político: destruir o fascismo para reconquistar as liberdades da democracia burguesa, embora fosse no terreno dos regimes políticos da burguesia, do estado burguês. Concretamente, não planteou que era necessária uma revolução democrática que liquidara o regime totalitário fascista, como parte do primeiro passo do processo em direção à revolução socialista, e deixou pendente este grave problema teórico.” A proposta de Trótski era a formação de frente únicas operárias que deveriam combinar a formação das milícias operárias armadas com todo o Programa de Transição para derrotar o fascismo e avançar contra a estrutura do regime burguês, que o fascismo não muda. Portanto, as palavras de ordem democráticas são fundamentais nos países abertamente ditatoriais, mas representam apenas uma tática para mobilizar as massas e não uma etapa independente; e devem levantar-se em conjunto com as palavras de ordem transitórias. O fascismo representa a reação da burguesia imperialista e não da aristocracia Medieval; portanto, é preciso lhe contrapor os métodos da revolução proletária mundial, da revolução permanente.
  19. Sobre a situação na Polônia no início da década de 1980: “nós devíamos plantear a legalização de todos os partidos que Solidariedade considera legais. Mas isso não impede, não vá contra os princípios, plantear a legalidade política em geral, não dentro dos soviets. Os soviets podem fazer uma lei parecida a qualquer lei burguesa, que diga: Reconhecemos a qualquer partido … se há uma grande manifestação armada pedindo a legalidade para a democracia cristão e a burocracia diz “Não”, o que nós fazemos? Iremos em contra da manifestação? Talvez nos somemos a ela. O problema é tático …” Isto é democratismo burguês ou pequeno burguês puro. A política revolucionária só reconhece a legalidade dos partidos operários. Moreno adotou a teoria dos dois campos burgueses progressivos: colocar-se a reboque do campo “democrático” contra o campo contrarrevolucionário. A luta pelo socialismo ficou para algum momento futuro.
  20. Na “Escola de Quadros de 1984”, Moreno disse que Trótski teria se equivocado “total e absolutamente na sua análise e política sobre o fato mais importante – revolucionário e contrarrevolucionário – que tem acontecido na história, que é a Segunda Guerra Mundial, e por isso somos uma seita”. A política correta teria sido combater ao lado do “imperialismo democrático” contra o fascismo, criticando-o no que fosse necessário.
  21. Nas “Teses sobre a Assembleia Constituinte da atualização do Programa de Transição” de Moreno disse: “as palavras de ordem e as tarefas democráticas adquirem cada vez mais importância devido às tendências mais profundas, tanto do imperialismo como dos monopólios e a burocracia. Todos eles têm uma tendência permanente a estados totalitários. É a única maneira de colocar um freio no curso permanente ascendente do movimento de massas”.  Valeria para todos os tipos de estados; ou seja, o regime político estaria por cima do caráter de classe dos diferentes tipos de estado burguês. Desapareceu assim o Programa de Transição. Derivado desta caracterização, Moreno levantou a palavra de ordem da Assembleia Constituinte para a Polônia, dizendo que uma vez que Solidariedade tomasse o poder devia convoca-la, o que o alinhava com o programa do imperialismo e do Vaticano. A LIT levantou a mesma política em relação à União Soviética e à Alemanha Oriental.
  22. Em março de 1983, no informe à Direção da LIT-CI, Moreno disse: “O Partido não entendeu que tinha se aberto uma crise revolucionária na qual o poder estava no ar e ao alcance do movimento operário e de massas. A outra cara de não termos denunciado a manobra do governo foi não termos levantado como grande consigna de poder, para contrapô-la à Constituição de 1853, a da Assembleia Constituinte (achamos que estamos em mora a respeito deste problema, com um tremendo atraso de um ano) como a principal palavra de ordem de poder do Partido, para opor a contrarrevolução democrática, contra a eleição presidencial baseada numa Constituição reacionária com um Senado omnipotente, eleito na sua ampla maioria nas províncias menos habitadas, menos proletárias. Perante a tentativa da burguesia e dos militares de recompor o poder burguês, de superar a crise do aparato militar por meio da Constituição de 1853, nós lhe opomos a palavra de ordem da Assembleia Constituinte.” “Como temos analisado, conseguimos precisar as tarefas imediatas do Partido, orienta-lo, localiza-lo e, ao mesmo tempo, definimos a situação como revolucionária. Se aceitamos a conclusão deste informe sobre a importância para toda a etapa como palavra de ordem fundamental a da Assembleia Constituinte, teremos arredondado nosso programa para enfrentar o governo de Bignone.” Junto com isso, foi levantada a palavra de ordem “Todo o poder ao Congresso de 1976”, que supostamente seguiria a política de Trótski na Alemanha, embora que este o tenha feito para atrair as camadas médias quando a mobilização democrática ainda se encontrava no início. A política de Moreno ficou totalmente entravada no pseudo democratismo burguês. Não há uma única palavra em relação à disputa do poder pela classe operária a partir dos próprios órgãos de poder numa situação em que tinha se aberto uma crise revolucionária. Na Espanha, Trótski orientou o uso da palavra de ordem da Assembleia Constituinte Revolucionária quando a mobilização ainda estava orientada à “República” e, na França, contra as Cortes de Berenguer, convocada por um governo operário e popular surgido de uma insurreição triunfante.
  23. A política para a construção do MAS esteve orientada para um grande partido eleitoral de massas, muito solto e frouxo. Esse também foi outro dos fatores que facilitaram a sua explosão em vários pedaços após a morte de Moreno.
  24. As políticas estruturadas por Moreno com absoluta clareza a partir de 1982 estiveram na base da atuação do MAS e da LIT-CI, e foram ainda muito mais direitizadas com as Teses de 1990. Na Argentina, a Assembleia Constituinte, sem deixar claro quem devia convoca-la, foi transformada em eixo de agitação desde 1982, deixando de lado as formas soviéticas, os conselhos de trabalhadores. Isso tem como base social o próprio caráter de classe da esquerda argentina que, no fundamental e principalmente a esquerda “Trótskista”, tem uma alta composição social das camadas médias da população, principalmente dos estudantes de Buenos Aires, Rosário e Córdoba, que dominam as direções. No Argentinazo, que estourou em dezembro de 2001, o fator fundamental no auge da luta foi o movimento de desempregados e contra a carestia; a classe operária correu por fora e nunca esteve planteada a questão da disputa do poder, a não ser a consideração de que as assembleias populares (de classe média) seriam embriões do duplo poder. A política revolucionária devia ter agitado um programa e uma política de poder operário e popular, com chamados a formar conselhos de trabalhadores; nunca se deve levantar a política de combinar uma assembleia burguesa com organismos de poder operário. Enganações parecidas levaram à derrota de revoluções triunfantes, como a Revolução Boliviana de 1952 (a única dirigida por um partido “trotskista”), e a conter várias situações revolucionárias. De onde votam os burgueses e os latifundiários somente pode resultar a enganação aos trabalhadores e as traições sem fim. E mesmo se hipoteticamente, as reivindicações triunfasse, sem o controle do poder do estado será impossível coloca-las em prática; e mesmo o que for colocado em prática será retirado a seguir.
  25. Os componentes centrais da teoria da revolução permanente de Trótski, contra o etapismo e a revolução num só país, são: “que os objetivos democráticos das nações burguesas atrasadas, na nossa época, conduziam à ditadura do proletariado, e que esta punha à ordem do dia as reivindicações socialistas”, a luta pela democracia burguesa e o socialismo unida por um nexo de continuidade. Durante a revolução socialista “cada nova etapa é consequência direta da anterior … se desenvolve por meio do choque entre os distintos grupos da sociedade em transformação.” “O caráter internacional da revolução socialista … é consequência inevitável do estado atual da economia e da estrutura social da humanidade.”

Algumas conclusões centrais

  1. A decadência do capitalismo não leva à formação automática da consciência revolucionária pela classe operária e as massas, até que algum fato importante a provoque, tal como um colapso capitalista importante ou uma guerra, por exemplo.
  2. Hoje a principal tarefa colocada para o movimento operário revolucionário passa por defender na prática, e de maneira não sectária, os princípios fundamentais do marxismo revolucionário (do socialismo científico), sem cultos à personalidade, e sim como a ciência, o método, da revolução proletária mundial. 
  3. É preciso vincular o socialismo científico ao movimento de massas e, principalmente, ao movimento operário. Hoje começou a se formar uma situação similar com a que Marx e Engels viveram na luta pela formação da I Internacional Comunista, em 1964, da qual eram uma ínfima minoria em relação a outras correntes que tinham ligações com o movimento operário: lassaleanos, proudhonistas, blanquistas, bakuninistas etc. Com muita firmeza na defesa dos princípios, muita flexibilidade tática, muito trabalho disciplinado e muito trabalho recorrente e cotidiano, o socialismo científico (marxismo revolucionário) saiu da I Internacional Comunista tão fortalecido que acabou dando lugar, mesmo que de maneira muito contraditória, à formação da II Internacional Socialista sob os princípios do marxismo. Sob as suas cinzas, de maneira ainda mais dramaticamente contraditória (o que é normal nas condições do imperialismo), deu lugar à III Internacional Comunista, como partido operário revolucionário de massas mundial. 
  4. A IV Internacional não conseguiu sair do chão devido às condições políticas, à fragilidade do que foi denominado “trotskismo”,  que na prática, foi liquidado com a morte de León Trótski, fundamentalmente, devido à gigantesca pressão do imperialismo aliado ao “estalinismo” numa formidável frente popular mundial contrarrevolucionária que tinha como principal objetivo derrotar a revolução proletária mundial nas condições da crise que se abriu com a crise de 1929 e a Segunda Guerra Mundial.
  5. Hoje o “estalinismo” não existe mais. Os grandes partidos de massas da esquerda de massas, assim como os poderosos sindicatos e organizações sociais de massas também não existem mais. O grande capital vive a pior crise estrutural da história e se encaminha rapidamente ao maior colapso capitalista mundial. Cada vez mais o enfrentamento aberto entre a burguesia imperialista e a classe operária mundial e as massas se torna iminente. Aquele está adotando métodos de guerra civil para enfrentar a crise. 
  6. O papel dos revolucionários marxistas que realmente defendem o socialismo científico, como o guia para a ação revolucionária, que têm como princípios estratégicos a luta pela revolução proletária mundial e a construção do partido da revolução proletária mundial, é se agrupar sob a base desses princípios, para organizar a luta e enfrentar a crescente brutalidade dos ataques do capital. Sob essa base é preciso assimilar criticamente as contribuições de outros importantes revolucionários, da mesma maneira que Lenin e o próprio Trótski estudaram e assimilaram os ensinamentos de Karl Kautsky, Augusto Bebel, William Liebknecht, George Plekhanov, Rosa Luxemburgo e de vários outros, sem por isso terem se convertidos em “kautskianos”, “plekhanovianos” ou “luxemburguistas”. É preciso estudar e assimilar com muito cuidado a história das revoluções; em outras palavras, é preciso fortalecer o socialismo científico, como o guia de ação para a revolução operária mundial, como arma para enfrentar as difíceis e complexas situações colocadas. Obviamente, essa tarefa não tem absolutamente nada a ver com renegar os princípios fundamentais do socialismo científico, nem introduzir teorias oportunistas pequeno-burguesas. 
  7. O Programa Revolucionário deve ser defendido em todas e quaisquer circunstancias, e não grandes personalidades, por maiores que elas sejam, e ainda pior em bloco, sem separar claramente as contribuições dos erros. Lenin foi contra o uso do termo “leninismo”; ele sempre se auto considerou um discípulo de Marx e nada mais, ou seja um construtor e aplicador do socialismo científico. Ele também extraia o melhor dos grandes revolucionários, mesmos que eles tivessem capitulado depois ou cometido erros, e chamava à defesa do legado revolucionário; era o caso, por exemplo, de Kautsky, Plekhanov, Bebel, Liebknecht pai, e de vários outros. Se trata da construção do socialismo científico como a ciência da revolução proletária mundial, mas entendendo claramente o que a constrói, como reflexo dialético da realidade, como um guia para a ação, para ser materializado, do que busca simplesmente implodi-lo sob a pressão pequeno burguesa que é fruto da pressão do grande capital. 
  8. O primeiro desafio para os revolucionários é assimilar o socialismo científico como um guia para a ação, considerando que Lenin disse que essa tarefa não é possível sem ter entendido profundamente O Capital, e fundamentalmente o método utilizado na sua elaboração, a dialética materialista. Para isto, Lenin orientava sobre a necessidade de estudar profundamente a Ciência da Lógica de Hegel.
  9. O segundo desafio dos revolucionários hoje é aplicar o Programa Revolucionário na prática com total dedicação e energia revolucionária. A experiência do levante popular do Chile mostrou que mesmo sem a existência de partidos operários revolucionárias é possível avançar na luta concreta do movimento de massas, nas novas condições atuais. O terceiro desafio é ligar o Programa Revolucionário ao movimento operário mundial, à cabeça do movimento de massas.
  10. O papel do partido operário revolucionário deve ser concentrar e dirigir a força das massas, principalmente da classe operária mundial. Em circunstâncias favoráveis, a aplicação do programa revolucionário com a dedicação firme e abnegada de um grupo de revolucionários pode converter-se em um partido operário revolucionário de massas. Trótski dedicava todo o seu tempo e recursos para a revolução; até no exílio, onde vivia das suas publicações, da venda dos seus arquivos e de algumas doações menores. Mas também não duvidou em priorizar as suas convicções políticas mesmo quando isso lhe significasse qualquer tipo de problemas, até a sua própria morte.
  11. Os autodenominados “trotskistas” atuais, mais sérios, que não se venderam nem desmoralizaram, e que lutam pela revolução operária mundial, depois da escalada mais forte do imperialismo para impor o chamado “neoliberalismo”, principalmente após a queda do Muro de Berlim, ficaram numa espécie de gueto, com altas doses de sectarismo, assim como aconteceu com os demais agrupamentos da esquerda revolucionária mundial. 
    1. O ensinamento de Trótski sobre o foco na defesa do Programa quando se perdem as posições organizativas, acabou sendo caricaturizado e transformado num “trotskismo literário”, e hoje em militância quase exclusiva pela Internet, sem qualquer ligação com o movimento de massas. Em parte, a causa esteve na paralisia do movimento operário, mas o fator fundamental foi a incapacidade para caracterizar e dar respostas à situação política. Sem superar o “trotskismo literário” e afins, que é próprio do período de paralisia, que já começou a ser superado em vários países, e vincular-se imediatamente ao movimento de massas, é impossível ser revolucionário. E vale a pena lembrar que para um verdadeiro revolucionário, a luta é mundial.
    2. O centrismo e o sectarismo têm sido a constante desses agrupamentos até por causa do isolamento do movimento operário que tem sido muito dificultado pela integração aberta da esquerda oportunista e da burocracia sindical à “democracia imperialista” e ultimamente até às várias manifestações de pinochetismo
    3. A firmeza revolucionária, a moral do militante operário revolucionário, a convicção sobre a necessidade de se dedicar integralmente a organizar a revolução, se tornou numa tarefa inadiável, dada a gravidade da evolução da situação política. É preciso pensar como se tivéssemos apenas algumas semanas ou meses de vida.
    4.  A política do período de refluxo, onde a luta revolucionária era tratada como um passatempo, priorizando a própria vida doméstica é inaceitável e perigosa dado que o imperialismo passou a utilizar métodos de guerra civil. É preciso romper com as amarras pequeno burguesas que, pelo caráter confunde o que deve ser feito com o como deve ser feito (as tarefas), imitando, mesmo que o façam inconscientemente, os métodos de todos os setores da esquerda pequeno burguesa burocratizada e integrada ao regime. O como as tarefas devem ser realizadas é um componentes do planejamento, que deve ser realizado com muito cuidado, analisando objetivamente a situação em relação aos resultados buscados. A resolução de problemas é o coração dos verdadeiros dirigentes revolucionários. As tarefas que pareciam verdadeiramente impossíveis foram realizadas, como a derrota da “fortaleza inexpugnável” dos franceses em Dien Piu em 1954, ou a derrota da maior potência militar do mundo por camponeses semi analfabetos. Ou o agrupamento dos revolucionários russos por Lenin a partir do Jornal Iskra; ou quando ele teve que fazer de tripas coração após a derrota da Revolução de 1905, com o partido desmantelado e membros do Comitê Central abandonando a luta para se tornar religiosos; ele “respirou fundo” e em condições muito precárias continuou, a fazer o devia ser feito. Ou os esforços de Trótski, em condições extremamente difíceis, para que o Programa Revolucionário fosse atualizado com as experiências muito críticas das décadas de 1920 e 1930. Ou o esforço de Marx para elaborar O Capital em situação de penúria extrema. Ou o esforço do Che Guevara que abandonou o conforto da vida de ministro, a esposa e cinco filhos para criar 2, 3, mil Vietnãs. Ou o esforço de muitos heróis anônimos que lutaram nas condições mais difíceis, como os presos políticos da burocracia soviética e muitos outros heróis na América Latina. É preciso ter vontade política de realizar (mas de verdade) e de romper com as amarras pequeno burguesas com o regime … antes de que seja tarde.
    5. As dificuldades para sair da defesa semi acadêmica do Programa para a aplicação do Programa na prática, são grandes, principalmente por causa do contágio e da pressão pequeno burguesa. Mas essa é a tarefa colocada com altíssimo senso de urgência hoje, por causa do acelerado aprofundamento da crise capitalista mundial e do acirramento da luta de classes. Devido a que a burguesia imperialista aplica métodos de guerra civil abertos, urge organizar a resistência de massas, antes de que as principais lideranças sejam massacradas, as demais neutralizadas e as massas, no geral, submetidas sob a bota de uma nova onda de pinochetismo feroz (que implica em duríssima repressão, torturas, assassinatos, desaparições, rebaixamento mórbido das condições de vida etc.), imposto pela crise, como condição para direcionar o mundo a uma nova guerra mundial (o que dificulta também as rotas de fuga. Na Europa, o fortalecimento do fascismo é assustador), a “saída” capitalista à crise dada a crescente dificuldade do grande capital para extrair lucros da produção. A situação é grave; muito mais grave do que quase todos estão pensando. O nosso papel é alertar, criar o senso de urgência e chamar todos a lutar, mas seriamente. Cada vez há, e haverá, menos espaço para o “faz de contas” ou o centrismo.; a burguesia imperialista declarou uma guerra de classes e a crise a impele a atuar, a sair deste impasse, a destruir as cabeças e converter os trabalhadores em verdadeiros párias.
    6. O espontaneísmo exagerado de Trótski, e de Rosa Luxemburgo, do período anterior a 1917, é mantido, como caricatura, pelos agrupamentos “trotskistas” que não se venderam, com a esperança de que, com o ascenso de massas, poderão sair das prioridades domésticas para se envolver na luta revolucionária real. Essa política é perigosa e desarma os revolucionários, os deixa inertes ou semi-inertes e ainda muito frágeis perante a pressão pequeno burguesa e direta do imperialismo. Há várias frases que expressam essa política e se tornaram muito perigosa, um verdadeiro suicídio político, principalmente por camuflar o problema, numa espécie de auto-engano, dada a gravidade da situação: “concordo com tudo, mas não dá para fazer”, “preciso cuidar da minha vida pessoal”, “ninguém está fazendo nada”, “vamos esperar”, “quando estourar o ascenso, aí eu faço (ou fujo)”. Foi a insurreição contra esse “trotskismo” de bohemia o que agigantou o “morenismo”, pois, apesar de muito contaminado de oportunismo, a vida de Nahuel Moreno sempre teve uma forte orientação prática e ao movimento de massas. 
    7. No ascenso de massas, somente uma pequena parte dos militantes burocratizados e dos impregnados pelo “burocratismo doméstico” conseguirão fazer o salto para uma militância séria, verdadeiramente revolucionária. A enorme maioria quebrará, como sempre aconteceu, o que terá consequências que poderão ser catastróficas, dada a evolução da situação política, principalmente se não for possível organizar a resistência das massas à altura do necessário. Pareceria ser mais provável que os militantes da ala esquerda da burocracia sindical ou dos movimentos sociais, na hora que perderem a base material e as suas organizações ficarem sobre ataque direito, façam a inflexão à esquerda. Isso junto com os novos militantes que surgirão ao calor da luta. Quem estiver contaminado pelo “cretinismo doméstico” e/ou pelo “cretinismo acadêmico”, devido ao desligamento do movimento de massas real, dificilmente conseguirá reagir; a tendência mais normal seria fugir ou aplicar a política do avestruz, continuar como se não fosse com ele (lembrar dos exemplos históricos sobre isto).
  12. A separação entre a teoria e a prática revolucionárias tem sido a constante de todos os grupos centristas na evolução para grupos abertamente oportunistas, o que acelera em situações revolucionárias como as que começaram a aparecer no horizonte. A prática revolucionária exige respostas precisas, mas deve ser avaliada no seu desenvolvimento contraditório rumo à revolução proletária mundial, ou seja, uma série de batalhas que conduzem à grande guerra estratégica. O próprio Trótski, por exemplo, foi contra o uso da força militar do Exército Vermelho, entre 1920 e 1921, para tomar Geórgia e a Polônia, contra a opinião da maioria do Comitê Central encabeçado por Lenin, que esperava que a proximidade do Exército Vermelho provocasse levantes operários.
  13. A tarefa principal colocada hoje é criar um centro de direção revolucionário firme e muito disciplinado, e com o firme propósito de vincular-se e dirigir o movimento operário e de massas mundial. Capaz de atuar como o embrião do partido operário revolucionário mundial e com capacidade de influenciar o movimento de massas, inclusive em vários países. 
    1. A política deverá ser elaborada a partir da caracterização da situação política em desenvolvimento contraditório, expressada em palavras de ordem e militada (propagandeada e agitada) de maneira centralizada e coordenada, em primeiro lugar a partir de um órgão de imprensa central.
    2. Os métodos “leninistas” fundamentais de organização do partido operário revolucionário devem estar na base da construção, tais como a existência de um núcleo central profissional, o papel da imprensa, o centralismo democrático, a crítica e a autocrítica, a tática subordinada à estratégia, a luta legal e não legal etc.
    3. O debate de ideias e teórico é fundamental para apoiar a caracterização e a elaboração política; deve estar orientada a resultados práticos.

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