Totalitarismo, Parte 2 – Trotsky e a ascensão do Nazismo

Por: Marcos Lima

“Eles nos acusam de não tolerarmos outros partidos além do movimento nazista. Eu declaro aqui, diante de vocês e de toda a nação alemã, que realmente é nosso objetivo eliminar esses 30 partidos da Alemanha”

(Adolf Hitler, 27 de julho de 1932)

Este pequeno texto está na sequência do primeiro para entendermos as diversas interpretações sobre os regimes totalitários que se estabeleceram depois da Primeira Guerra Mundial. No texto anterior, apresentei a interpretação de Hanna Arendt, por ser ela uma das autoras mais lidas quando se fala do tema. Não entrei em posicionamentos políticos partidários a respeito da autora e não é intenção fazer isso com os próximos. Apenas apresentar seu pensamento a respeito.

Em 1930 Trotsky analisou o resultado das eleições na Alemanha e identificou o crescimento do fascismo antes mesmo de Hitler ser nomeado Primeiro Chanceler. Nelas o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) – Partido Nazista, passou de 12 para 107 cadeiras no Parlamento. Nunca foi um partido de esquerda; desde o seu nascimento era centrado no racismo, no antissemitismo e no nacionalismo e contrário ao comunismo e aos sindicatos.

O nazismo, em termos ideológicos foi a radicalização de tendências da ultradireita que já existiam desde a Iª Guerra Mundial. As afirmações do Ministro do Exterior do governo Bolsonaro, Ernesto Araújo, de que o nazismo foi um movimento de esquerda, não tem aceitação em lugar nenhum do mundo, inclusive na Alemanha, portando só as faz por malícia.

E ainda, o nazismo era totalmente contra o marxismo e o comunismo, não tinha nada de socialista apesar de ter “socialismo” no seu nome, aliás “nacional” e “socialista” foi uma forma astuta de recrutar todos os insatisfeitos com situação econômica e política. Se os nazistas trataram com certa simpatia demagógica os trabalhadores foi porque precisava do apoio das massas.

A crise de 1929 na base da subida do nazismo ao poder

Em 1929 aconteceu o pico da crise do capitalismo com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York. Na Europa e na Alemanha, a crise era enorme. Com o agravamento da crise econômica abre-se uma crise política e a burguesia vê a possibilidade de abrir-se uma nova crise revolucionária onde ela poderia ser expropriada.

Ocorreu uma polarização entre os extremos, a solução contrarrevolucionária por um lado e a da esquerda revolucionária por outro; os setores vacilantes começam a se enfraquecerem. Contudo de esquerda (principalmente os comunistas e os socialistas, que eram os principais partidos operários de massa) não crescia na mesma proporção ao nazismo. A política da esquerda foi muito vacilante e não deu segurança aos trabalhadores para enfrentar o nazismo; vacilou quando era necessário determinação. Vacilou sobretudo, segundo Trotsky, porque não chamavam a uma frente única defensiva contra o fascismo.

Em grande medida, o problema estava no chamado “Terceiro Período”, a política oficial da Internacional Comunista validada no VI Congresso de 1928 que caracterizava a socialdemocracia como “socialfascismo” o que a impedia de fazer alianças, apesar dela dirigir um número muito importante, se não a maioria, das organizações operárias. Era o reflexo do aprofundamento das contradições na União Soviética que aparecia na luta com e contra os camponeses ricos, os kulaks.

A República de Weimar engendrou o nazismo

marechal Hindenburg

A República de Weimar, que era capaz de dar direito a asilo a monarquistas, mas não o dava a revolucionários, foi um período de 14 anos com 21 governos. A crise política era provocada pela crise econômica. Havia um enorme desgaste dos partidos de centro-esquerda e centro direita. Os extremos se fortaleciam. O Partido Nazista, cinco anos após a sua fundação, teve apenas 1,1% dos votos com o general Ludendorff, na primeira eleição presidencial da história da Alemanha, em 1925, vencida pelo marechal Hindenburg, da direita tradicional. Em 1930, após a crise da bolsa de 1929, teve 16% nas legislativas. Na presidencial, em 1932, Hitler saltou para 30% no primeiro turno e 36% no segundo turno.

Em 1932, pelos números oficiais, havia cerca de 5,6 milhões de desempregados. O povo depositou sua confiança em Paul von Hindenburg para tirar o país da crise, mas ele não foi capaz de fazer isso, não tinha como, a crise era mundial de todo o capitalismo. Além do mais em 1930, ele já estava com 83 anos de idade. A esse tempo o Partido Nazista já tinha também ampla maioria no parlamento.

Os comunistas cresciam em boa desvantagem com relação aos nazistas. A direção do Partido Comunista, que estava seguindo as orientações da IIIª Internacional, não reagiu à altura do crescimento do fascismo; não preparou nada, não mobilizou os trabalhadores e foram caçados um a um e enviados para os campos e concentração.

O poder dos nazistas começou ainda no governo de Hindenburg, em fevereiro de 1933 com o Decreto de Fogo do Reichstag. Foram canceladas a maior parte das liberdades civis e políticas estabelecidas pela Constituição. Centralizava o poder e, o mais importante, o Decreto tinha efeito retroativo. Marinus van der Lubbe, um ativista antifascista, foi condenado à pena de morte acusado de ter sido o causador do incêndio no Reichstag (sede do parlamento).

A partir do Decreto também começaram a ser construídos os primeiros campos de concentração. Hindenburg não viu os horrores do nazismo, ele morreu em 1934 e Hitler constitucionalmente concentrou todos os poderes em suas mãos. O arcabouço político e jurídico foi chocado desde dentro da República.

O que é o fascismo/ nazismo?

Mussolini e Hittler

O totalitarismo (fascismo e nazismo) não pode ser confundido com qualquer outro regime autoritário ou ditatorial, pois ele necessita da mobilização de massas desesperadas, principalmente as camadas médias da população.

Os grandes capitalistas impulsionam o fascismo por causa do medo das forças repressivas não serem suficientes para conter o ascenso revolucionário.

O totalitarismo (fascismo e nazismo) não precisa de um golpe de Estado no sentido de um assalto ao poder, ele pode surgir desde dentro do regime democrático burguês, ou seja, com eleições. O nazismo tinha um pé nas Freikorps, grupos paramilitares que tiveram a complacência da República de Weimar e foram usados para reprimir os comunistas após a I Guerra Mundial. Foram eles que reprimiram a Liga Espartaquista e assinaram seus líderes Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo em 15 de janeiro de 1919.

O Partido Nazista – Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) – foi fundado em 1920 e apresentava-se contra a concentração do poder econômico das grandes empresas como estratégia para cooptar os setores das massas que certamente iriam apoiar os comunistas. Em 1930, dá o giro e renomeia com principais inimigos os marxistas e os judeus.

Quando Hitler foi nomeado chanceler por Hindenburg, Joseph Goebells organizou uma marcha com mais de 20 mil componentes das SA, em 30 de janeiro de 1933. O desfile passou pelo Portão de Brandemburgo com tochas, era uma oportunidade para uma demonstração simbólica de forças. Quando Mussolini tomou o poder em Roma, havia 40 mil Camisas Negras prontos para “crer, obedecer, combater”. Só forças políticas expressivas conseguiriam promover tal espetáculo. Os desfiles militares muito sincronizados eram parte deste espetáculo.

O fascismo de massas toma o poder e torna-se “fascismo burocrático”

No fim de 1933, Hitler organizou eleições, perseguindo a todos seus oponentes. O Partido Nazista obteve 92% dos votos. No ano seguinte, no que ficou conhecido como Noite das Facas Longas (noite de 31 de junho para 1º de julho de 1934) dá início ao expurgo do seu partido eliminando praticamente todos os líderes das SA, anti-hitleristas e mesmo direitistas, como Gustav von Kahr (fora ministro e presidente da Baviera) e Gregor Strasser que tinham divergências com ele, principalmente a partir da tentativa de golpe (Putsch da Cervejaria) quando Hitler, em 1923 tentou dar um golpe na região a partir da capital Munique.

O nazismo conseguiu uma recuperação econômica considerada um “milagre” naqueles anos de crise. No entanto é preciso compreender que uma forte centralização do Estado no planejamento de obras públicas e da indústria de armas foram as principais responsáveis pelo crescimento.

Em 1935, foi reintroduzido o serviço militar obrigatório. Em 1936, foi reativada a força aérea (Luftwaffe). É interessante registrar que para a indústria de armas foram recrutados mais de 5 milhões de estrangeiros, principalmente do Leste Europeu, essa foi considerada a maior operação de escravização de pessoas do mundo, organizada por Fritz Sauckel, membro do Partido Nazista responsável por esta tarefa.

O sonho inicial de Hitler era fazer uma marcha sobre Berlim como Mussolini havia feito sobre Roma. Despois da tentativa fracassada de golpe e ter sido preso ele começou a dourar o seu discurso para agradar aos setores conservadores mais reticentes e controlar o poder pelas vias legais. Hitler tinha medo de perder o controle das SA que contava com 3 milhões de membros e eram mais “moderados”.

Uma política para arrasar o movimento de massas

Foto da rebelião em Varsóvia

O fascismo/ nazismo tem como objetivo principal passar um trator sobre o movimento de massas que ameaça o poder da burguesia.

O nazismo matou aproximadamente 6 milhões de judeus, 2 milhões de poloneses não judeus, centena de milhares de comunistas, ciganos, homossexuais, Testemunhas de Jeová, deficientes físicos e mentais, entre outros. É um movimento que tem um componente altamente racista.

Hoje seus alvos foram substituídos por imigrantes, negros, árabes, mulçumanos e homossexuais. Combina elementos pragmáticos do neoliberalismo com fundamentalismo religioso pentecostal. O Nazismo perseguiu todos os partidos políticos, organizações sindicais, movimento sociais. Todos seus inimigos eram considerados como “inimigos da pátria”.

Mas o nazismo é responsável principalmente pela morte de 24 milhões de soviéticos, assim como os fascistas japoneses foram responsáveis pela morte de quase 30 milhões de chineses.

Os trabalhadores estavam insatisfeitos com a política da República de Weimar (1919-1933) quando o desemprego e a inflação eram altíssimos. Foi neste meio que a direita encontrou campo fértil para recrutar seus membros, com destacamentos bem organizados de grupos violentos que perseguia inicialmente comunistas, sindicalistas e anarquistas. Com líderes como Ernest Hörm, filho de um ferroviário, evidente que a maioria dos cargos de liderança nos grupos de assalto e caça aos inimigos estavam nas mãos de indivíduos da classe média, advogados e oficiais do exército que não tinham ocupação depois de terminada a Iª Guerra Mundial.

As direções da esquerda operária impediram qualquer luta séria contra o nazismo

Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD)
Partido Comunista Alemão (KPD)

Segundo Trotsky o crescimento gigantesco do nazismo se deu principalmente devido ao empobrecimento da população e ao espaço que a esquerda concedia para a direita ao não organizar a revolução.

Ele viu o desencadear dos acontecimentos na Alemanha, a formação do partido nazista e o seu crescimento, o papel das direções locais e a política de Stálin para os partidos comunistas, a instabilidade dos governos na República de Weimar e a tolerância destes, quando não cumplicidade, com os grupos paramilitares.

A frouxidão da direção do Partido Comunista Alemão (KPD) e do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD), que diga-se, havia votado a favor dos créditos de guerra em 1914, esquecendo-se da luta de classes e em “defesa da pátria”, foi o fator principal que possibilitou o crescimento do nazismo e da chegada de Hitler ao poder, sem falar na política ultra esquerdista do stalinismo que impedia a unidade dos trabalhadores para lutarem.

As diversas tentativas e revoluções na Alemanha, mostraram que as lideranças da esquerda estavam semeando derrotas. A derrota da greve geral iniciada em 28 de janeiro de 1918 com a entrada do SPD, claramente no sentido de traí-la eram sinais claros de que a esquerda na Alemanha estava orientada ao cretinismo parlamentar. Deu no que deu e Trotsky viu pelo nevoeiro que o monstro seria grande, quando todos ainda nem imaginavam que ele estava em gestação.

A única forma de deter este monstro seria a unidade da classe trabalhadora e o avanço da luta concreta para organizar os trabalhadores e criar os organismos defesa contra as falanges fascistas. A saída para a grave crise deveria ser apresentada aos trabalhadores: a expropriação da propriedade privada e o governo dos trabalhadores com a cooperação econômica com a União Soviética.

Leon Trotsky

“A fascistização do Estado significa (…), antes de tudo e sobretudo, destruir as organizações operárias, reduzir o proletariado a um estado amorfo, criar um sistema de organismos que penetre profundamente nas massas e esteja destinado a impedir a cristalização independente do proletariado. É precisamente nisto que consiste a essência do regime fascista.”

(Leon Trotsky)

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