Vale a pena lembrar a entrevista do ex agente da CIA e da NSA Edward Snowden

“Democracia ou “Brutal Ditadura”?

O jornal Gazeta Operária traduziu a entrevista do Jornal The Guardian com Edward Snowden, o ex-agente da NSA e da CIA. Os relatos deixam claro o sistema de espionagem montado nos Estados Unidos. Leia a entrevista na íntegra:

“Eu não quero viver numa sociedade que faz este tipo de coisas… Não quero viver num mundo em que é gravado tudo o que digo ou faço.”

Edward Snowden

Entrevista original

The Guardian: Por que você decidiu denunciar a atuação da NSA?

Edward Joseph Snowden: A NSA construiu uma infraestrutura que lhe permite interceptar praticamente tudo. Com esta capacidade, a imensa maioria das comunicações humanas é gravada de maneira automática e sem selecionar alvos específicos. Se, por exemplo, eu quero ver os seus correios eletrônicos ou saber qual o é o telefone da sua esposa, simplesmente posso usar os métodos de interceptação.

Desta forma, posso apossar-me dos seus e-mails, das senhas, dos registros de telefone, dos números de cartões de crédito.

Eu não quero viver numa sociedade que faz este tipo de coisas… Não quero viver num mundo em que é gravado tudo o que digo ou faço. Não se trata de que eu esteja disposto a apoiar ou viver sob este regime.

The Guardian: Mas não seria necessária a vigilância para diminuir as probabilidades de atentados terroristas como o de Boston?

Edward Snowden: Temos de decidir por que o terrorismo é uma ameaça nova. Sempre existiu terrorismo. O atentado de Boston foi um ato criminoso. E o que o resolveu não foram as técnicas de vigilância mas sim o bom e antiquado trabalho da polícia. A polícia faz muito bem o trabalho.

The Guardian: Considera-se outro Bradley Manning?

Edward Snowden: Manning foi o exemplo clássico de alguém que denunciou uma situação inspirado na proteção do bem-estar da sociedade.

The Guardian: Acha que o que você fez é crime?

Edward Snowden: Vimos muitos delitos cometidos pelo governo. É uma hipocrisia que agora me acusem disso. Eles restringiram a esfera da influência pública sobre o governo.

The Guardian: O que você acha que irá acontecer com o senhor?

Edward Snowden: Nada de bom.

The Guardian: Por que escolheu Hong Kong?

Edward Snowden: Eu acho verdadeiramente trágico que um cidadão dos Estados Unidos tenha que se mudar para um lugar considerado menos livre. Ainda assim, Hong Kong tem uma certa fama de liberdade, apesar de pertencer à República Popular da China. Possui uma sólida tradição de liberdade de expressão.

The Guardian: Que revelam os documentos tornados públicos?

Edward Snowden: Que a NSA mente de forma sistemática perante os questionamentos do Congresso sobre o alcance dos programas de vigilância [espionagem] nos Estados Unidos. Eu acho que, quando os senadores Rum Wyden e Mark Udall perguntaram que dimensão que tinha essa vigilância, a NSA alegou que não tinha as ferramentas necessárias para poder dar uma resposta. Claro que existem essas ferramentas. Eu tenho os mapas que mostram os lugares onde se vigiou o maior número de pessoas. Interceptamos mais comunicações digitais nos Estados Unidos do que a Rússia.

The Guardian: Que pensa dos protestos da administração Obama sobre a pirataria cibernética feita pela China?

Edward Snowden: Nós pirateamos tudo e em qualquer lugar. Gostamos de diferenciar-nos dos demais, mas atuamos em quase todos os países do mundo. Em países com os quais não estamos em guerra.

The Guardian: É possível usar medidas de segurança para se proteger da vigilância do Estado?

Edward Snowden: Vocês não têm nem ideia do que é possível fazer. A extensão das capacidades de atuação da NSA é assustadora. Podemos introduzir programas em todos os computadores e, assim que a pessoa entrar na rede, identificar a máquina. Uma pessoa nunca está a salvo, por mais que se proteja.

The Guardian: A sua família conhecia os seus planos?

Edward Snowden: Não. A minha família não faz ideia do que aconteceu. O meu principal receio é que eles exerçam represálias contra a minha família, os meus amigos, a minha esposa. Qualquer pessoa com quem eu tenha relação. É algo que iria me atormentar pelo resto da vida. Não poderei manter comunicação com eles, pois [o governo norte-americano] agirá com truculência contra qualquer pessoa que tenha me conhecido. Isso me deixa sem poder dormir.

The Guardian: Quando você decidiu divulgar os documentos?

Edward Snowden: Uma pessoa vê coisas indignantes. A medida que vai vendo tudo, percebe que algumas dessas coisas são um verdadeiro abuso. E pouco a pouco vai crescendo a consciência de que estas coisas estão erradas. Não houve um momento em que eu acordei [e tomei a decisão]. Foi acontecendo.

Em 2008, muita gente votou em Obama. Eu, não, votei num terceiro partido. Mas acreditei nas promessas de Obama. Eu já ia revelar tudo [mas esperei por essas eleições]. Ele continuou as políticas do presidente anterior [George Bush Jr.].

The Guardian: Qual é a sua opinião sobre as declarações de Obama sobre a divulgação dos documentos na sexta-feira, ao mesmo tempo que se posicionava a favor de uma discussão sobre o equilíbrio entre segurança e transparência?

Edward Snowden: Minha reação imediata foi que ele estava com dificuldades para defender o indefensável. Ele tentou justificar o injustificável e com certeza tinha plena consciência disso.

The Guardian: E em relação à resposta em geral sobre as revelações?

Edward Snowden: Eu fiquei surpreso e satisfeito ao ver que os cidadãos reagiram com energia em defesa dos direitos que lhes estão sendo retirados sob a desculpa da segurança. Não chega a ser um Occupy Wall Street, mas começa a se formar um movimento pela base no sentido de sair às ruas no dia 4 de julho [Independência dos Estados Unidos] em defesa da Quarta Emenda à Constituição dos EUA [que proíbe explicitamente a interceptação das comunicações sem ordem judicial]. Chama-se Restabeleçamos a Quarta Emenda, e teve origem no Reddit [www.reddit.com]. A resposta na Internet foi grande, com enorme apoio.

The Guardian: O analista de política externa Steve Clemons, que trabalha em Washington, disse que no aeroporto Dulles [Washington DC] tinha ouvido quatro homens discutindo sobre uma reunião de espiões na qual tinham acabado de participar. A propósito dos vazamentos de informações, um deles disse, segundo Clemons, que deveriam fazer “desaparecer” tanto o jornalista quanto o autor dos vazamentos. O que você pensa disto?

Edward Snowden: Alguém comentou essa notícia e disse que “os verdadeiros espiões não falam assim”. Pois bem, eu sou um espião e garanto-lhes que é assim que falam. Cada vez discutíamos no gabinete acerca de como lidar com um crime, nunca defendiam os procedimentos legais, defendíamos ações contundentes. Dizem que mais vale atirar de um avião essas pessoas a pontapés do que permiti- lhes aparecer um dia na frente de um tribunal. No geral, a mentalidade é muito autoritária.

The Guardian: Você está seguindo algum plano?

Edward Snowden: A única coisa que posso fazer é sentar-me e esperar que o governo de Hong Kong não me extradite. A minha intenção é solicitar asilo num país com valores iguais aos meus. O país que mais me parece segui-los é a Islândia. Eles apoiaram pessoas que defenderam a liberdade na Internet. Não faço ideia sobre o futuro que me espera.

Podiam emitir uma ordem de detenção através de Interpol. Mas não creio ter cometido nenhum delito fora do domínio dos Estados Unidos. Creio que uma ordem como essa mostraria de maneira inequívoca tratar-se de uma questão política.

The Guardian: Acha que provavelmente vai acabar na prisão?

Edward Snowden: Não teria podido ter feito tudo isto sem estar disposto a aceitar o risco de ir para a prisão. Não é possível enfrentar as agências de espionagem mais poderosas do mundo sem assumir esse risco. Se realmente querem capturar-te, com o tempo, vão acabar conseguindo.

The Guardian: Que sente agora, quase uma semana após o primeiro vazamento de informações?

Edward Snowden: Acho que a indignação que provocou foi justificada. Deu-me esperanças de que, independentemente do que acontecer comigo, o resultado será positivo para os Estados Unidos. Não acho poderei voltar ao meu país, apesar de que é o que eu gostaria de fazer.

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